24 Maio, 2020
Nota: A versão completa da tomada de posição poderá ser consultada na área reservada aos sócios da Associação Portuguesa de Fisioterapeutas, na secção “Documentação”.
A Associação Portuguesa de Fisioterapeutas (APFisio) e do seu Grupo de Interesse em Fisioterapia Cardiorrespiratória (GIFCR) enviaram uma tomada de posição relativa ao webinar “Cuidados de Enfermagem de Reabilitação a pessoas com COVID-19” dinamizado pela Mesa do Colégio de Especialidade de Enfermagem de Reabilitação, disponibilizando-se para, em conjunto com o Ministério da Saúde e as ordens profissionais, contribuir para definir o papel dos diferentes profissionais de saúde no âmbito da reabilitação respiratória nacional, contribuindo para a salvaguarda da saúde da população portuguesa.
No referido webinar é explorada uma abordagem que se basta à atividade de um único profissional de saúde, o enfermeiro especialista em enfermagem de reabilitação (EEER), demarcando-se de todas as recomendações da reabilitação respiratória, eventualmente colocando em risco a segurança e qualidade dos cuidados de saúde prestados ao cidadão com COVID-19 quando na sua profundidade não demonstra a inclusão das recomendações internacionais de multidisciplinaridade profissional. A óbvia omissão de uma equipa de reabilitação, pretensamente substituída pelo EEER, constitui uma desqualificação dos cuidados de saúde prestados ao cidadão e um eventual risco para o mesmo.
Algumas exposições fundamentaram-se através da referência a uma guideline acerca do papel e das competências do fisioterapeuta especialista na área de fisioterapia respiratória no âmbito da COVID-19 [1], elaborada pela Chartered Society of Physiotherapy, que é um documento sobre a função e as competências do fisioterapeuta, que não pode ser apropriado por outro grupo profissional. Não consideramos que este ato seja digno de ser reconhecido como de partilha de conhecimento, mas antes de usurpação, que coloca em causa a missão de uma Ordem, nomeadamente quanto à segurança e qualidade dos cuidados prestados.
Outra referência muitas vezes citada ao longo do webinar, o Guia Orientador de Boa Prática (GOBP) da Reabilitação Respiratória (Cadernos da Ordem dos Enfermeiros Série 1 Número 10), perpetua esta visão redutora e desatualizada da reabilitação respiratória. Este documento preocupa-nos especialmente porque se baseia num conjunto de saberes produzidos essencialmente por e para fisioterapeutas, sendo que das 493 referências do GOBP, 178 são de fisioterapeutas (~36%), para além de conter inúmeras descrições de procedimentos que se baseiam assumidamente na literatura como pertencentes ao corpo de saberes da fisioterapia [e.g. 2].
Urge, pois, denunciar que a propriedade científica do corpo de saberes, apresentado como fundamento no ciclo de webinars e evidente no GOBP, não corresponde a evidência científica da Enfermagem de Reabilitação, mas sim, a evidência científica de um corpo de saberes de outros profissionais, nomeadamente da classe profissional dos fisioterapeutas.
Preserve-se, portanto, a interdisciplinaridade e não a transdisciplinaridade, respeitando o âmbito e atribuições das classes profissionais no âmbito da reabilitação respiratória, tão bem descrito no consenso internacional da European Respiratory Society [3].
Lisboa, 21 de maio de 2020
O Conselho Diretivo Nacional da Associação Portuguesa de Fisioterapeutas
Referências:
[1] https://www.csp.org.uk/documents/coronavirus-respiratory-physiotherapy-call-guidance
[2] Pasquina P, Tramèr MR, Granier JM, Walder B. “Respiratory physiotherapy to prevent pulmonary complications after abdominal surgery – A systematic review” Chest. 2006 Dec;130(6):1887-99