Autonomia profissional do Fisioterapeuta – Esclarecimento

2 Janeiro, 2020

O estatuto profissional e o processo de formação inicial do Fisioterapeuta têm-se desenvolvido nos últimos anos. A evolução no plano legislativo foi uma consequência natural, no contexto nacional, mas ainda não acompanha a realidade de muitos países, onde o Fisioterapeuta é hoje um profissional de primeiro contacto.

A Fisioterapia é uma disciplina científica autónoma, a que corresponde uma profissão regulamentada e que possui um corpo de saberes específico, resultando de um processo de formação ao nível da Licenciatura, Mestrado e Doutoramento em Fisioterapia. Durante a sua formação, os Fisioterapeutas são preparados para um exercício profissional autónomo, em que, face a uma avaliação inicial do utente, são capazes de definir objetivos a serem atingidos, de selecionar as estratégias terapêuticas adequadas para os atingir, e de avaliar os resultados obtidos, com o intuito de ajustar a sua intervenção à evolução do utente.

O Fisioterapeuta é um profissional de saúde, dotado de autonomia profissional, nos termos da lei. Esta afirmação é fundamentada, a nível internacional, pelo reconhecimento da European Skills, Competences, Qualifications and Occupations (ESCO) do Fisioterapeuta como um profissional de saúde autónomo, responsável pelos atos de Fisioterapia que pratica junto dos seus clientes, com o código 226.4 da Classificação Internacional das Ocupações – ISCO-08, à qual, no âmbito da prestação de serviços de saúde, compete a avaliação, o planeamento, a interpretação, a tomada de decisão clínica, o tratamento e a avaliação dos resultados da sua intervenção.

Também a nível nacional, a autonomia do Fisioterapeuta é referida pelo Decreto-Lei n.º 111/2017, de 31 de agosto, que estabelece o regime da carreira especial de técnico superior das áreas de diagnóstico e terapêutica, no âmbito do Serviço Nacional de Saúde, onde a Fisioterapia se insere, no pressuposto legal de carreira especial da Saúde, tal como outras, nomeadamente médica e de enfermagem, conferindo-lhes a carreira uma total autonomia profissional, técnica e funcional, numa linha própria identitária.

Segundo este documento, que revoga o anterior Decreto-Lei nº 564/99, de 21 de dezembro, as profissões abrangidas “devem ser exercidas com plena responsabilidade profissional e autonomia técnico-científica, sem prejuízo da intercomplementaridade funcional com os outros profissionais de saúde também integrados em equipas multidisciplinares”. Importa ainda referir que a carreira destes profissionais se organiza “por áreas da prestação de cuidados de saúde, nomeadamente, hospitalar, saúde pública, cuidados de saúde primários, continuados e paliativos, docência e investigação, podendo, no futuro, vir a ser integradas outras áreas”.

No âmbito da sua atuação, segundo o n.º 2 do artigo 5.º, do mesmo Decreto, os profissionais integrantes da carreira dos TSDT, no que ao caso interessa, o Fisioterapeuta deve:

“a) Conceber, planear, organizar, aplicar, avaliar e validar o processo de trabalho no âmbito da respetiva profissão, com o objetivo da promoção da saúde, da prevenção, do diagnóstico, do tratamento, da reabilitação e da reinserção”;

“b) validar, ponderar e avaliar criticamente o resultado do seu trabalho, assumindo a responsabilidade pelos cuidados de saúde prestados, e assessorar as instituições, serviços e estabelecimentos de saúde emitindo pareceres, de acordo com as qualificações detidas”;

“c) prestar cuidados e intervir sobre indivíduos, conjunto de indivíduos ou grupos populacionais, doentes ou saudáveis, tendo em vista a proteção, melhora ou manutenção do seu estado e nível de saúde”;

“d) Assumir responsabilidades de gestão e promover o desenvolvimento profissional, bem como participar em auditorias clínicas e de investigação para o desenvolvimento da prática profissional e da sua base científica”;

“e) Participar em processos de licenciamento de equipamentos e infraestruturas na área da respetiva profissão”.

Não pode, assim, neste âmbito, a autonomia do Fisioterapeuta ser delimitada por regulamentos internos de outras profissões, que definem os respetivos atos profissionais próprios, mas não no âmbito da fisioterapia. Tratando-se de regulamentos internos delimitados às respetivas outras profissões, só vinculam aqueles profissionais, e não outros, com os quais devem atuar no seio de verdadeiras equipas multidisciplinares.

No âmbito da complementaridade funcional e da defesa dos interesses dos seus utentes, os Fisioterapeutas devem sempre assegurar que, em cada caso específico, não existem razões clínicas que contraindiquem, ou condicionem, a utilização dos meios terapêuticos que tencionam utilizar.

Nesse sentido, sem prejuízo da organização interna de cada instituição/serviço, quando o utente procura o Fisioterapeuta, para fins terapêuticos, sem indicação expressa (escrita ou verbal) de um médico, é exigido, em termos éticos, que o Fisioterapeuta, depois de avaliar a situação e identificar os problemas a resolver, contacte com o médico responsável pelo utente, no sentido de o informar sobre a sua proposta de intervenção, compreender melhor a situação clínica do utente e identificar a existência de qualquer contraindicação, que imponha limitações à sua intervenção, devendo tal aferição ser enquadrada no respetivo consentimento informado.

É assim, em nome destes postulados, que se passou a reconhecer o direito ao registo das Unidades de Fisioterapia obrigando à existência de um responsável técnico Fisioterapeuta, sem necessidade de direção clínica, desde que a atividade seja precedida de uma indicação clínica, que pode ser efetuada por qualquer especialidade médica. Aliás, esta é uma realidade transversal nos Estados-membros da União Europeia.

Fica claro que, seja em contexto previsto pelo Decreto-Lei n.º 111/2017, seja em contexto privado, o Fisioterapeuta é um profissional dotado de autonomia, responsável pelos atos de Fisioterapia que pratica, a quem compete a avaliação, o planeamento, a interpretação, a tomada de decisão de fisioterapia, o tratamento e a avaliação de resultados junto dos seus clientes, sem prejuízo da multi e interdisciplinaridade, bem como das diretrizes emanáveis em estruturas orgânicas que determinem necessárias adaptações.

 

Conselho Diretivo Nacional da Associação Portuguesa de Fisioterapeutas

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